A Universidade Federal de Sergipe (UFS) publicou um edital de concurso público com a inédita reserva de 30% das vagas para candidatos negros. A medida cumpre um acordo judicial firmado em outubro de 2024 entre a universidade e o Ministério Público Federal (MPF), com o objetivo de reparar a não destinação de 41 vagas previstas pela Lei de Cotas em concursos anteriores para o cargo de professor efetivo.
O acordo é resultado de uma ação civil pública movida pelo MPF e contou com a participação da organização Educafro Brasil e do professor e advogado Ilzver Mattos, atuando como amici curiae – especialistas que auxiliam a Justiça em ações de alta complexidade.
“Esse é o primeiro edital da UFS com previsão de vagas 10% superior aos 20% já estabelecidos em lei, uma verdadeira conquista do movimento negro de Sergipe”, afirma a procuradora regional dos Direitos do Cidadão, Martha Figueiredo. Para ela, trata-se de um passo importante na reparação das desigualdades provocadas pelo racismo e pelo histórico descumprimento das políticas de ação afirmativa.
Além da reserva ampliada de vagas, a UFS também se comprometeu, por meio do acordo, a realizar campanhas de conscientização e divulgação sobre a política de cotas, tanto interna quanto externamente, por meio dos seus canais oficiais. No entanto, essa obrigação ainda está pendente. O MPF continua monitorando o cumprimento integral do pacto firmado.
De acordo com o edital, os candidatos interessados nas vagas reservadas deverão se autodeclarar negros no ato da inscrição, conforme os critérios de cor e raça do IBGE. A veracidade das informações será confirmada por uma comissão específica, que contará com a presença obrigatória do candidato durante o processo de validação.
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), ligada à Procuradoria Geral da República (PGR), considerou o acordo firmado em Sergipe como um modelo e já propôs uma ação coordenada nacional para que medidas semelhantes sejam adotadas por outras universidades federais. O procurador federal dos Direitos do Cidadão, Nicolao Dino, enviou ofício circular às unidades do MPF nos estados, incentivando a replicação da iniciativa.
Entenda o caso
A ação civil pública teve origem em uma investigação do MPF que constatou, entre 2014 e 2019, a prática irregular da UFS ao aplicar a Lei de Cotas em concursos para docentes. A universidade utilizava um fracionamento por especialidade ou lotação para calcular as vagas destinadas a candidatos negros, o que impedia a efetivação da política afirmativa. Como resultado, 41 vagas deixaram de ser reservadas em 30 dos 32 concursos analisados.
Após recomendação do MPF, a universidade corrigiu a metodologia em 2019, mas o Ministério Público entendeu que ainda era necessário reparar os danos causados anteriormente. Com base na decisão do Supremo Tribunal Federal na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 41, que proíbe fracionamentos que limitem o alcance da política de cotas, o MPF buscou a reparação judicial das vagas eliminadas.
Com a assinatura do acordo em outubro de 2024, a UFS se comprometeu a reservar 30% das vagas até alcançar a reposição das 41 não destinadas conforme manda a Lei. O edital lançado agora representa o início desse processo.